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17.7.17

Eu só tenho um corpo!...


"Eu só tenho um corpo! Para que preciso de mais do que duas mudas de roupa?". Esta era uma das frases bandeira do meu avô Alberto. Uma das muitas que eu achava uma parvoíce... Afinal a minha tia Teresa tinha, desde a minha mais tenra idade, mostrado que um corpo só precisava de muita roupa e ainda de mais sapato... Só porque era muito mais giro. 

Hoje, começo cada vez mais a perceber o que o meu avô queria dizer... De há dois anos para cá que o desperdício de dinheiro gasto em coisas que depois não vou usar com a regularidade merecida é uma realidade que me tem feito uma certa comichão interior (não nos órgãos, na alma).
Tanto que, desde Outubro do ano passado, tenho feito um exercício mental muito engraçado quando vou a lojas onde normalmente me costumava perder e desgraçar com facilidade. Para começar entro em lojas de roupa e sapatos com muito menos regularidade... Como dizem "longe da vista, longe do coração". Quando entro porque me apetece muito ver as modas novas, apesar de me dar a mesma vontade de comprar, de experimentar tudo o que gosto e de gostar de como me ficam uma série de artigos, de pegar neles e estar convicta que os vou levar, raramente saio da loja com compras. O segredo? Tenho uma conversa mental (e muitas vezes verbal em voz baixa) comigo...

"Precisas mesmo disto Andreia?" 
"Bem, precisares não precisas de nada... Até tens lá em casa parecido e não usas assim tanto."
"Este sapatos são giros para o casamento da Inês... Mas os verdes que tens lá em casa também ficam super giros e poupas 30€."
"Quantas combinações podes fazer com estas calças?... Sim, só dá mesmo com esta blusa."

Enquanto auto-formato a minha mente dou mais uma, ou duas, voltas pela loja... A roupa ou sapatos que carrego nos braços deixam de me parecer tão bonitas e essenciais. Volto a colocar tudo de onde as pesquei e saio meio hesitante mas sem olhar para trás. Nos dias seguintes, desce em mim uma sensação de satisfação por ter resistido à tentação. O oposto que sentia quando comprava as coisas só porque sim. Parece uma tontice apenas mas não é. É sentir que se tem controlo e que me estou a guiar por bom senso e não pela gula das compras. 

Hoje em dia, e em tão poucos meses é rara a compra de que me arrependa depois. E é rara a peça de roupa ou sapatos que não use até ao fim dos dias (excepto aqueles sapatos e vestuário que são peças de poucas ocasiões mesmo). Como compro muito menos roupa e sapatos dou por mim a usar roupa que, por vezes, estava longos meses parada no armário. Permito-me comprar algumas peças da moda mas na promessa de ser daquelas que posso combinar de milhentas formas com os 70% de roupa básica e neutra que compõe o meu roupeiro. 

Outra melhoria pessoal é que não me apego às coisas como se precisasse delas para ter vida... Isso, assumo, era de tamanha infelicidade que até torço o nariz a mim mesma quando penso como me apegava tanto às coisas. Não espero 3 anos sem usar uma roupa ou sapatos para perceber que está na hora de os dar. Regularmente, talvez uma vez a cada 2 meses, olho para o armário e digo: "esta vai... Foste uma boa camisa mas está na hora de ires para outra casa.". Mudança importante, não serve de desculpa para ir a correr às lojas substituir aquele novo espacinho no armário.

Esta, pequena, mudança na minha relação com as compras de roupa e acessórios trouxe-me uma, gigante, alteração na minha qualidade de vida. Havia uns quantos projectos que estava sempre a adiar porque direccionava o meu dinheiro só naquele sentido. Não entendam que me tornei num grande exemplo de poupança financeira. Nada disso. Poupo da mesma forma... Só aquele pezinho de meia para uma eventualidade e para aquela viagem. Fora isso, se me esfolo tanto a trabalhar, uso o fruto do meu trabalho o mais que posso. Mas uso-o bem... Passeio mais, vivo mais, experimento comeres diferentes, vivo mais, sobra mais para viagens até onde moram os amigos, vivo mais, deixo o troco no quiosque onde bebo o café ou no Sr da Praça do peixe porque fui bem atendida, vivo mais, apoio associações de protecção animal, vivo mais, dou aquele miminho à minha casa sem ter que contar trocos, vivo mais...

A vida é mesmo uma coisa, maravilhosamente, tramada. Está sempre a mostrar-me, algumas vezes de formas pouco fofinhas e muito dolorosas, que as verdades de hoje são as insignificâncias do amanhã... Deve ser isto que é crescer. Será? Aprender o valor real das coisas da vida. Descobrir que a maioria das "coisas" que nos dão felicidade e razão de ser e sentir não se compram por dinheiro nenhum. Esse, o dinheiro, é usado na minha vida para os "extra-felicidade".  Mal comparando é como se eu vivesse numa bolha onde sou feliz, e dentro da qual estão o meu Ursinho, as pessoas que me fazem bem, os animais filhos, a minha casa (e todos os seus utensílios de cozinha... Mas só porque me dão horas de felicidade quando cozinho) e os sentimentos que agradeço diariamente por lá estar. Depois as coisas (mesmo coisas) são apenas adornos exteriores à minha bolha... Como autocolantes de papoilas e gatinhos fofinhos e um ou dois balões em forma de coração. Estão lá para me dar um bocadinho mais de giro e conforto à minha bola mas estão lá na medida certa... Não deixo e não quero perder a vista mágica para o exterior da minha bolha. 

"Eu só tenho um corpo! Escolho vivê-lo em vez de mascará-lo" 
(um claro upgrade à frase bandeira do meu avô).


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